Croniquinha "vadia" mais linda do meu Blog (colaboração do mestre VôSogroCunhaPai)
Bolero...
Calor.
Os dedos gastos no teclado repetem sinais que ninguém vê. Sombras nascidas do
inconsciente, o calor, o calor, a fé cega e faca amolada, amolada...
Calor.
Uma caixa repercute baixinho, as ondas crescem, o mar se espraia... Longe.
Voltar à rotina, ao batucar das teclas, preto no branco, branco na preta, preta
no branco, loura paixão, louca paixão...
Ravel? Paranóia? Paratudoparaparapreparadopara? Sair, voltar?
Calor.
A sala é a sua sala, mas não é mais a sua sala, a sua mesa não é a sua mesa, a
mulher na cadeira que é e não é a sua, sorri sem jeito, sem vontade...
- Como?
Olha em volta, tudo igual e tudo diferente, o ar é o mesmo, as coisas não. Há
gente e seus amigos, onde estão? Gente e não pessoas, a individualidade se
esfuma em solo de sax e retinir de caixas e címbalos...
- Onde estão todos?
- O senhor está bem? Quer um copo de água?
- Saí agorinha mesmo pra tomar um café e não sei mais onde estão todos.
Enlouqueci?
- O senhor nunca esteve aqui antes, nunca esteve, nunca esteve, nunca esteve...
- Quebrou o disco, o CD sei lá o quê, quem é você?
- Aqui ainda não é o seu lugar, o senhor não é daqui!
A caixa retine, os trombones surgem, graves, o calor, o calor...
Violinos gemem, caixa repercute, batem címbalos, rapsódia eterna e onde estão
os meus amigos, a minha casa, o meu trabalho, a minha vida?
- Atravessou o portal?
A mocinha de branco diz que não, ainda sentada na mesa que já não guarda mais a
minha memória, a minha saudade, os meus anos dourados, a rapsódia amplia a
resposta com novos instrumentos, mais altos, mais graves, mais e mais calor e,
de repente, não muito mais que súbito e cristalino, o fim.
Quando? Como? Pôr que?
Passar pelo tempo e só?
Todos juntos agora.
Scherzo? Vibrato!José Cunha Filho
Meu "inspirador" de crônica
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